quarta-feira, abril 12, 2006

França: não há bolo para todos ou ... aberta a Caixa de Pandora

Com o fim do processo do CPE, a “rua” venceu o Governo.
É simples. A França (e não só) está dividida em três grupos:
Os Bem Reformados a usufruir de “rendimentos” não totalmente produzidos por eles.
Os Bem Empregados, no mercado de trabalho protegido por normas rígidas.
Finalmente, os Jovens Desempregados ou ... mal empregados.
Os dois primeiros grupos ganham eleições e, dessa forma, defendem-se a si e aos seus “direitos adquiridos”, por detrás dos mecanismos da Democracia Representativa.
O terceiro grupo anseia ao mesmo que os que os antecederam.
Mas, não há “bolo” para todos...

O modelo social europeu somado com o da democracia eleitoral, representativo das maiorias, é utilizado pelos dois primeiros grupos para se assegurarem da manutenção daqueles “direitos”.
Ao terceiro grupo, pouco lhes resta.

Que não a “rua”…
Que, vencendo agora (como venceu) é uma Caixa de Pandora… aberta.

O CPE é o menos. Era um instrumento dos dois primeiros grupos que, lá do alto da segurança das suas reformas e empregos, se destinava a criar alguma vantagem na (nova) empregabilidade dos terceiros. Solução de remedeio, sem “tocar” nos seus benefícios… Até porque novos empregos... são cada vez mais uma falácia. Destruída por este próprio sistema (em contraponto com outros, nomeadamente asiáticos).

O terceiro grupo, na rua, recusou esse “presente envenenado”. Vantagem sim (mesmo que não se apercebessem disso), mas também uma cedência, na comparação dos direitos com os usufruídos pelos outros grupos. Inaceitável.

Afinal, “porque seremos sempre nós a ceder”? Terão dito.

Foi uma bandeira de esquerda. Mas os resultados finais serão “liberais”.
Afinal não há “bolo” para repartir por todos. E a esquerda só sabe protestar e propor formas de dividir o “bolo”.
Fazer o “bolo”? Não é com eles…

Não cedendo os Jovens (pois a rua passará a mandar), vão ter que ceder os outros…
Mesmo tendo a seu lado e ao seu dispor, as instituições democraticamente eleitas, os partidos e as maiorias parlamentares. E vão ter de ceder nas reformas e na rigidez dos empregos… Dando um fim aos “direitos (mal) adquiridos. Pelo menos até onde for necessário para que a sociedade seja viável. E isto significará ter que ir longe...

E o liberalismo vencerá. À custa da luta de “rua da esquerda” que ironicamente, trabalha a favor (porque será esse o resultado final) para o fim do tal modelo social que lhes é tão caro.
Irónico e curioso mas, como não há “bolo” para todos…

E a democracia representativa tal como a conhcemos? Como ficará?
Um problema…

terça-feira, abril 04, 2006

Primeiro Emprego – o impasse europeu

O processo francês caminha para uma solução. Uma solução que não leva a lugar nenhum.
O contrato proposto (CPE), que serviria para criar motivos que valorizassem uma contratação de jovens (primeiro emprego) deverá ser alterado, ao ponto de ser letra (quase) morta.
Assim, não haverá razões suficientes para contratar jovens. As opções das empresas manter-se-ão centradas nos trabalhadores com experiência comprovada que verão os seus ordenados subir. Com isso, aumentarão ainda mais as desigualdades e se reduzirão as disponibilidades de emprego. Pois, se se paga mais a uns limita-se, orçamentalmente, a opção por mais e novas contratações.

Assim, com esta luta de rua, os jovens ganharão segurança no seu primeiro emprego que, para um terço deles, poderá nunca surgir…

As desigualdades sociais crescerão.

O processo francês é um processo europeu. Extrapola-se com facilidade.

A Europa não entendeu (as maiorias votantes não entenderam) que o seu modelo social está doente.

Que é necessário iniciar um (doloroso) processo de cura. E que caminho, a percorrer, terá de resultar em esforços a dividir por todos (um pouco a cada um) com o risco de não sobrar nada para ninguém.

Temos três camadas fundamentais na sociedade:

1º A geração de 1968 (a grisalha) que actualmente está na reforma a usufruir de benesses insustentáveis (o que recebem não tem paralelo com os descontos que efectuaram).


2º A geração seguinte, actualmente (e rigidamente) no mercado de trabalho, a descontar para os primeiros e “assobiando para o ar” no referente aos seus benefícios futuros. Acham-nos assegurados pela geração seguinte, através do seu destes. Podem ter uma surpresa…

3º A geração jovem que diz agora não querer o PEC. Afinal quer as mesmas benesses das gerações anteriores. Nem mais, nem menos. Uma fatia significativa dos seus está no desemprego. Infelizmente, a globalização (a superioridade das economias americana e asiáticas são evidentes) continuará a eliminar mais e mais empregos. Sem emprego não poderão salvaguardar as suas necessidades actuais nem precaver o futuro. Muito menos poderão descontar para o grupo anterior as prestações sociais que aqueles necessitam e contam como seguras…

Porque é necessário o PEC?

Porque os empregos na Europa estão rigidamente ocupados. Opta-se (através de leis) por manter no emprego um mau trabalhador que ganha bem, em detrimento de um bom trabalhador (jovem) que ganhará menos e trabalhará mais. Não se quer entender que este, ganhando menos e produzindo mais, reforçará a economia europeia, tornando-a concorrente das “ameaças globais” e libertará recursos para suportar o subsídio de desemprego do tal mau trabalhador que deveria substituir. O inverso é que já não verdadeiro: o mau trabalhador não produz sequer por conta do rendimento que aufere. E, assim, tudo se desmorona…

Os que estão na reforma entendem ter “direitos adquiridos” a salvaguardar. Mesmo sabendo que nunca descontaram (integralmente) para esse efeito.

Os que trabalham não prescindem da sua segurança de emprego. Mesmo produzindo abaixo da sua remuneração.

E estes dois grupos, juntos, ganham eleições.

Os jovens que não trabalham e que serão cada vez mais são minorias votantes. Não têm “voz” e massa crítica decisiva nos processos eleitorais usuais e vêm o seu futuro em queda rápida para o abismo. Abstêm-se da política pois esta não lhes diz (e dará) nada. A maioria grisalha e a maioria trabalhadora segura não lhes abrirão nenhumas portas…

Estaremos a atingir o fim do modelo socialista democrático?

Julgamos que sim. Pois as maiorias votantes seguem sempre quem lhes acene com menos reformas e mais estabilidade… e não é isso que as nossas sociedades precisam.

Estaremos a chegar a um beco sem saída?

Provavelmente.

domingo, abril 02, 2006

Xeque-mate aos medicamentos genéricos

Há alguns dias atrás o Ministro Correia de Campos anunciou publicamente que a prescrição médica iria ser alterada.
O Governo socialista tem surpreendido. Pela positiva. Tem enfrentado lobies, corporações e tomado medidas reformistas corajosas.
Mas, não brilha pela sua coerência.
Não querendo ser extensivo, verifica-se que os lobies da construção civil, bancário, indústria farmacêutica e a corporação médica têm sido salvaguardados (e beneficiados).

Todo o Mundo enveredou, na sua política do medicamento pelos genéricos. Nada de surpreendente. Afinal, porque pagar um custo (ou sobrecusto) de um medicamento quando, legalmente, já não é necessário (porque já pago, antes)? Quando já existe no mercado esse mesmo medicamento (princípio activo) com outra forma, livre desse custo?

A resposta, deverá tê-la o Sr. Ministro…
Resposta essa que não devem conhecer os Países mais desenvolvidos do Mundo e os serviços hospitalares da tutela do mesmo ministro onde o receituário é feito de forma diversa (pelo princípio activo) aí, sem “prejuízo do doente” como demagogicamente vão referindo os (únicos) beneficiados desta medida ou sejam, a Indústria Farmacêutica (que lhes vê paga uma quantia desmerecida, ou seja o custo do desenvolvimento, já fora de prazo) e os Médicos a quem, de uma forma ou outra, chega uma parte desses valores ilicitamente pagos por todos os consumidores (neste caso, forçados e desprotegidos, porque doentes).

Primeiro, foi eliminado um apoio extra na comparticipação (de 10%) destes medicamentos. Económicas não foram de certeza as razões que levaram a essa decisão. Afinal, a diferença de preços entre o medicamento de marca e o respectivo genérico é tão significativa, que os 10% extra encontravam-se, por excesso, nessa margem.

Depois, é concretizada esta alteração, pouco relevada pela imprensa (afinal, a agenda da imprensa é a agenda do Governo): os médicos antes eram obrigados a anotarem na prescrição (receita) a impossibilidade de alteração de um medicamento (de marca) pelo seu genérico. Agora é o contrário. Só se anotarem essa possibilidade é que a alteração pode ser feita. Não parece, mas é uma alteração relevante.

Antes, o médico não detinha o poder? Falso.
Poderia impedir a mudança da marca pelo genérico. Bastaria referir essa intenção e justifica-la. Como não há justificação tecnica (que não seja demagogica) disponível, sentiam-se coarctados. Não no seu poder de prescrever, mas no seu poder de impor o mais caro, por interesses que nada têm a ver com o doente.

Nos Hospitais o receituário é feito pelo princípio activo. E a saúde dos doentes não vem a terreiro por causa disso. Será porque aqui é o orçamento do Ministro Correia de Campos que paga a diferença?

Nos Países do Norte da Europa e nos EUA, os genéricos são largamente utilizados. Será que há menor preocupação com os doentes nesses países?

Entretanto a medida vai avançar e os genéricos vão morrer (ou demorar muitos e muitos anos a se impor ao nível do resto dos países comparáveis com o nosso).
Aplausos dos Médicos e da Indústria Farmacêutica. Uns vão poder continuar a prescrever no sentido desejado pelos outros, que lhes atribuirão as conhecidas contrapartidas…

O Povo vai pagar e, desta vez a ANF, acossada noutras matérias, para eles muito mais importantes e núcleares, não vai perder tempo e desperdiçar recursos combater a medida...

Às vezes questiono se o “ataque” (lícito em algumas matérias) do Ministro à ANF não tem (também) estes objectivos: desliga-los destas “batalhas mecenárias” (neste caso sem interesse directo próprio) atacando o seu núcleo base de interesses apenas para fazer passar, sem oposição (todos estarão distraídos e a imprensa está domada) estas medidas que só interessam aos lobies e corporações.

Uma tristeza…